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Vice-líder governista apresenta proposta que contraria estratégias do Aliança pelo Brasil

DEPUTADO LUCAS VERGÍLIO (SOLIDARIEDADE-GO) PROTOCOLOU PROJETO QUE SUSPENDE A DISPENSA DE VALIDAÇÃO PRESENCIAL PARA RENOVAÇÃO DE CERTIFICADOS DIGITAIS. FOTO: LUIS MACEDO/CÂMARA DOS DEPUTADOS

RODOLFO COSTA

O deputado federal Lucas Vergílio (Solidariedade-GO) apresentou uma redação polêmica no Congresso. Na segunda-feira (9/12), ele protocolou o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 734/2019, que suspende a dispensa de validação presencial para renovação de certificados digitais. O texto caiu como uma bomba no setor, responsável pela emissão de documentos eletrônicos. Basicamente, o que chamou a atenção de empresários é que Vergílio, vice-líder do governo na Câmara, apresentou uma matéria que, na prática, desfavorece o Palácio do Planalto.

O mercado de certificação digital entrou de vez no radar político depois que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) autorizou a coleta de assinaturas eletrônicas, em uma decisão que favorece a celeridade para a criação de partidos políticos, como o Aliança pelo Brasil, partido para o qual Bolsonaro se filiará quando estiver formalmente homologado. Continuada a tramitação do PDL apresentado por Vergílio, a tendência é encarecer os produtos oferecidos pelo setor, em um movimento que pode contaminar a demanda e parte de estratégias do Aliança.

Em 3 de dezembro, mesmo dia em que o TSE tomou a decisão que favorece a criação do Aliança, o Comitê Gestor da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) — entidade vinculada à Casa Civil da Presidência da República responsável por regulamentar o setor — deliberou uma regra infralegal que permite que certificados digitais possam ser emitidos online no ato da renovação. A medida, na prática, torna o mercado menos dependente de intermediários para a emissão de certificados e, por consequência, favorece o barateamento dos produtos.

O PDL apresentado por Vergílio, em contrapartida, pode causar um impacto contrário, admite um empresário do setor ouvido pelo Blog. “Embora a deliberação do comitê gestor tenha representado impactos sobre as pessoas jurídicas, é uma decisão que contamina as expectativas em todo o mercado”, ponderou. As suspeitas recaem para uma guerra comercial que se deflagrou depois que a Soluti, líder de mercado, ofertou, gratuitamente, 1 milhão de certificados digitais

Guerra comercial

Nos bastidores do setor, empresários apontam Manuel Matos, ex-membro do Comitê Gestor da ICP-Brasil, como o lobista responsável por Vergílio ter apresentado o PDL. Muito ligado ao setor de seguros, do qual atua o pai do parlamentar, Armando Vergílio, Matos é visto como um conservador no setor, que não gostou da ação comercial feita pela Soluti.

A guerra comercial se evidenciou no setor depois da promoção anunciada pela Soluti. A Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico (Camara-e.net) e a Associação Nacional de Certificação Digital (ANCD) tinham acenado com voto favorável para as mudanças conduzidas pela ICP-Brasil, mas mudaram o posicionamento depois de tomarem conhecimento da promoção da ação da Soluti.

Como disse anteriormente ao Blog, o CEO da Soluti, Vinícius Sousa, defende a estratégia comercial adotada, sustentando que se trata de um “teste grátis”, medida muito adotada em diferentes setores. “Nesse mercado, aqueles que usam mais os certificados e as assinaturas digitais, pagam pouco mais. Aqueles que usam menos, pagam menos. E foi inevitável que avançássemos nessa proposta para um modelo de free trial, oferecendo ao consumidor a oportunidade de experimentar grátis por um mês. A pessoa gostando, conhecendo, ela pode contratar pacotes de assinaturas depois desse período grátis”, justificou.

Razoabilidade

O advogado Leandro Bueno, especialista em direito empresarial e membro da Comissão de Defesa da Concorrência do diretório distrital da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), frisa que toda a definição de política de preços é de responsabilidade dos agentes econômicos e, em via de regra, diante do regime econômico capitalista, da livre iniciativa e da livre concorrência, não deve sofrer restrições do Estado. Ele alerta, contudo, que a estipulação de promoções, descontos e gratuidades por uma empresa sem justificativa comercial razoável, pode, em tese, caracterizar uma infração e punição.

Sob o ponto de vista do direito econômico, Bueno observa que, de um lado, em um enfoque mais amplo da proteção à concorrência, há a possibilidade de configuração de infração à ordem econômica de se vender mercadoria ou prestar serviços injustificadamente abaixo do preço de custo, ação chamada de “preço predatório”. “Nesse caso, o objeto de tutela é a concorrência e o ente responsável pela apuração é o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), que investigará os fatos após o recebimento de uma denúncia, ainda que de forma anônima”, justificou.

Os “preços predatórios” configuram-se apenas quando a prática de valores abaixo do custo ocorre não com um intuito de ação de marketing, temporária e localizada, mas com o objetivo de eliminar os concorrentes para, depois, explorar o mercado como um monopolista. Em um enfoque mais restrito, de proteção a um concorrente ou a um grupo concorrente lesado, há a possibilidade de caracterização de um ato de concorrência desleal, a qual se configura sempre que determinado ator comercial abusa do direito e age contrariamente a um padrão de boa fé mínimo mercadológico, ultrapassando os limites da competição saudável.

No caso da Soluti, que se propôs a oferecer um serviço gratuito por tempo determinado, de maneira localizada, aproveitando a expectativa de uma alta demanda pelo produto a fim de buscar reter alguns clientes após o período promocional, Bueno não enquadra a ação comercial como uma infração à ordem econômica ou mesmo um ato de concorrência desleal. “A depender dos argumentos utilizados para a promoção, pode não ser fácil provar a ocorrência de desvio de finalidade e, ainda, que este desvio seria de alguma maneira punível pelo direito econômico”, ponderou.

Saiba mais

Projetos de Decreto Legislativo tratam de matérias de competência exclusiva do Congresso, não sendo sujeitos a veto ou sanção presidencial. A tramitação nas comissões é igual a de projetos de lei comuns, podendo, inclusive, ser conclusiva, ou seja, dispensando a aprovação em Plenário. Caso seja submetido ao Plenário, o quórum para aprovação de um PDL é de maioria simples, 257 deputados, no caso da Câmara. Depois, o PDL ainda é revisado pelo Senado e, caso aprovado, é promulgado.

Fonte: Correio Braziliense

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