Artigo

Realidade pós-Covid deve impulsionar o uso de documento eletrônico e assinatura digital

Ao pensar em formas de prestar o melhor serviço ao cidadão, a opção é migrar uma série de procedimentos que antes eram presenciais para um formato totalmente digital

Por Patrícia Peck

Não são poucas as mudanças provocadas pela pandemia do Covid-19. Ainda é difícil fazer projeções, mas devido à condição de isolamento social, presenciamos uma importante aceleração da transformação digital, que vem exigindo bastante preparo em termos de planejamento de sustentabilidade para o futuro.

Há quem diga que vai ser o fim do dinheiro físico, com pagamentos via mobile ou carteira digital, outros apostam na reconfiguração dos espaços de comércio, com um mix de serviços de entretenimento, comunidade e vendas eletrônicas.

Independente dos formatos, sabemos que as relações e transações devem ser realizadas integralmente ou passar pelo meio digital, tendência evidente com a flexibilização das regras da telemedicina e da adoção em massa do trabalho remoto, por exemplo.

Com essa transição cada vez mais acelerada, as novas práticas só terão aderência com regulamentações que garantam transparência, segurança e responsabilização. Recentemente vimos no país um episódio muito sério no uso de assinatura digital, que pode envolver fraude processual e falsidade ideológica, e chama atenção para importância da autenticidade e integridade durante os processos.

Ao anunciar sua saída do cargo, o ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, declarou que não assinou a exoneração do diretor-geral da Polícia Federal, porém sua assinatura constava no Diário Oficial, num documento por certificado digital, o que garante a sua validade jurídica.

É um caso que levanta algumas hipóteses. Seja qual for a explicação, se há alguém que conhece o pin (senha) da assinatura eletrônica de uma autoridade, essa pessoa jamais poderia fazer uso sem sua ciência ou autorização. Imagine que risco de questionamento e insegurança jurídica isso poderia gerar nos atos oficiais e governamentais.

São várias as preocupações trazidas pela pandemia, mas há um aspecto que devemos estar muito atentos na execução de medidas emergenciais e do plano de ação: o cuidado com sigilo e proteção de dados pessoais.

Documento Eletrônico e Assinatura Digital

Ao pensar em formas de prestar o melhor serviço ao cidadão, com otimização de tempo e menor custo, a opção é migrar uma série de procedimentos que antes eram presenciais, com uso de fluxos em suporte em papel, para um formato totalmente digital.

É possível citar o exemplo da Inglaterra, onde o governo começou em 2012 um projeto para se relacionar com a população de forma online. Um sistema foi construído para oferecer 300 serviços, desde marcar o exame para carteira de motorista até agendar visitas em cadeias.

Seja por tentativas de desburocratização, de gerar mais rendimento ou dar mais celeridade e efetividade, tudo que trouxer mais segurança, conveniência e baixo custo, vem para ficar.

Temos que lembrar que esses procedimentos, antes de estarem baseados em leis, são frutos de usos e costumes. Quando há mudança no comportamento das pessoas, a regulamentação muda para se adaptar às novas necessidades e exigências da atual realidade.

Assim, há cada vez mais diretrizes para o uso dos meios eletrônicos de comunicação que possam ser seguidas pelos diferentes sistemas jurídicos, sociais e econômicos existentes no mundo.

No Brasil, vale destacar o artigo 369 do Novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), que consagra a possibilidade do uso amplo de meios legais para comprovar a verdade dos fatos, incluindo, por óbvio, os documentos eletrônicos.

Também são consideradas autênticas as declarações de vontade ratificadas por assinaturas eletrônicas que utilizam certificados digitais expedidos pela Instituição de Chaves Públicas Brasileiras (ICP-Brasil), ou outras modalidades de assinatura eletrônica, desde que aceito pelas partes envolvidas ou for admitido de tal forma.

Como é o caso dos comprovantes de pagamento autenticados por instituição financeira. A força (como fator de segurança ou conteúdo probatório) da autenticação realizada dependerá da quantidade e variedade dos fatores empregados:

Assinatura é toda marca, sinal ou operação que confira autenticidade à declaração de vontade, fixando seu teor de forma íntegra no tempo e espaço pelo emissor, onde autenticidade é o atributo que atesta a identidade do declarante (a pessoa é ela mesma) e a integridade é o atributo que determina que o estado dos dados emitidos pelo declarante não foi alterado após a aposição da assinatura. Para que possam ser utilizadas como meio de prova é imprescindível que as informações constituam um conjunto comprovadamente íntegro.

No caso de um cartório que certifica a autoria de assinatura em documentos eletrônicos, é feito um cadastro do cliente e de outros integrantes que necessitam reconhecer suas firmas, por meio de videoconferência e apresentação de documentos, biometria facial, dentre outros requisitos.

Assim, assinar um documento também significa conferir eficácia jurídica e validade a certa declaração de vontade ou a um conjunto de declarações de vontades em um suporte, seja ele digital ou físico, o que estabelece a celebração de um ato jurídico entre as partes.

São medidas para reduzir vulnerabilidades e garantir a autenticidade e a integridade das declarações de vontade de todos os envolvidos, de modo a assegurar que os dados armazenados não sejam adulterados, ou sobrescritos no transcorrer do tempo. A ideia é garantir que o conjunto de informações permaneça intacto desde a data de sua geração, sendo hábil para eventual perícia ou coleta de dados.

Nesse contexto, de maior sistematização digital e a necessidade de medidas de proteção para garantir a privacidade, segurança e autenticidade, é importante ressaltar que já começou o prazo para aplicação da Estratégia de Governo Digital (Decreto nº 10.332/2020). Dispõe sobre o uso de recursos de tecnologia da informação e comunicação, que abrange a transformação digital de serviços, a unificação de canais digitais e a interoperabilidade de sistemas.

Entre os objetivos, o documento estabelece o fornecimento de validações biométricas mensais para serviços públicos federais, a disponibilização de identidade digital ao cidadão, a criação de condições para a expansão e redução dos custos dos certificados digitais, a disponibilização de novos mecanismos de assinatura digital ao cidadão e o incentivo ao uso de assinaturas digitais com alto nível de segurança.

Ou seja, é um caminho que ruma para o uso maciço de dispositivos digitais que otimizam tempo e recursos, como interfaces de biometria e reconhecimento facial. São tecnologias que trazem muitos benefícios, precisam ser acompanhadas de regras de proteção, privacidade e neutralidade, e como outro recurso de identidade digital, precisam ser individuais e intransferíveis.

*Patricia Peck Pinheiro é sócia e sócia e Head de Direito Digital do escritório PG Advogados. Advogada especialista em Direito Digital, doutora pela Universidade de São Paulo, com PhD em Propriedade Intelectual e Direito Internacional, pesquisadora convidada pelo Instituto Max Planck e pela Universidade de Columbia, professora convidada pela Universidade de Coimbra e pela Universidade Central do Chile. Árbitra do Conselho Arbitral do Estado de São Paulo – CAESP, Vice-Presidente Jurídica da ASEGI, Conselheira de Ética da ABED, Presidente do Instituto iStart de Ética Digital. Autora de 22 livros de Direito Digital.

Fonte: Neofeed

 

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